O Espaço citadino Lisboa
No âmbito das investigações de carácter etnográfico a que o pintor consagrou muito do seu tempo, incluem-se os estudos sobre Lisboa. Porém, em relação à capital, ele alargou o seu campo de pesquisa, e muitas das suas investigações objectivam-se, por assim dizer, em função de uma vertente topográfica. Interessou-se, significantemente, pela arquitectura da cidade, procurando obter informações sobre antigas edificações, algumas já demolidas na época. Este trabalho exaustivo de recolha de elementos, que foi sendo efectivado ao longo dos anos, concretizou-se num elevado número de desenhos e de aguarelas, que foram publicados no álbum “Lisboa Velhaˮ, no ano de 1925. Na nota de abertura, através das palavras que o pintor profere, sente-se a nostalgia provocada pelas transformações a que Lisboa foi sendo submetida, ao longo dos anos, devido a imposições de critérios de urbanização, por vezes bem contestáveis. Podemos ler na nota explicativa que antecede o livro:
Os motivos seleccionados traduzem uma multiplicidade temática, embora o pintor tenha fixado, sobretudo, pela imagem colorida ou monocromática, aqueles aspectos que considerava típicos de uma certa forma de vida e que, de algum modo, constituem a verdadeira essência da alma lisboeta. Toda a produção de aguarelas e de desenhos constitui uma revivescência de antigos costumes, de tipos humanos que circulavam pela capital. Antigas ruas, praças, velhas habitações, igrejas e algumas construções monumentais figuram igualmente nesses registos iconográficos.
A sua inspiração encontra frequentemente incentivo na observação de certos locais da cidade, a que a patina do tempo concedeu um particular atractivo, ainda que neles tenha deixado marcas bem visíveis dessa vetustez. Roque Gameiro embrenha-se por ruas estreitas, por velhos becos e vielas tortuosas, dando vida às figuras dos seus habitantes, que nos surgem filtrados pela visão estética do artista, graças a uma perfeita execução plástica. Essas personagens surgem integradas no seu contexto vivencial, reflectindo os comportamentos habituais do seu quotidiano; muitas delas patenteiam um acentuado dinamismo nos gestos esboçados e revelam, implicitamente, determinados intuitos nas atitudes e nas expressões fisionómicas e corporais. É, na verdade, um retrato colectivo do viver de certas zonas da capital, de gente simples que circula pelas ruas, que aí vive, ou que para lá se desloca, oriunda dos arredores saloios. São os aguadeiros, as leiteiras, as lavadeiras e outros vendedores, alguns acompanhados por burros carregados de legumes e frutas.
Se atentarmos na sequência das imagens, verificamos que não foi propósito do pintor estabelecer um itinerário prévio que o levasse, ordenadamente, ao encontro da cidade. A essência de cada desenho e de cada aguarela aparenta ter tido origem em contextos situacionais que se depararam ao seu olhar, ao acaso de um vaguear, sem qualquer outro propósito além do de observar a realidade circundante e captar as imagens que potencializariam o despertar do seu ímpeto criador. Daí que, ao folhearmos este álbum, que constitui um verdadeiro legado artístico, cultural e histórico, sintamos uma espécie de apelo para que sigamos esses mesmos percursos, penetrando, virtualmente, nessa Lisboa diferente e já desaparecida. Poderemos, então, participar da visão que o artista captou, numa viagem no espaço e no tempo.
Maria Lucília Abreu
in A Aguarela na Arte Portuguesa, ACD Editores, 2008
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Obras que não fazem parte de Lisboa Velha:
Mosteiro dos Jerónimos
(Fachada sul)
Aguarela sobre papel
9 x 14 cm
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Porta lateral dos Jerónimos
Aguarela sobre papel
36 x 25,5 cm
1908
Ver:
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Capela de S Joao Batista
na Igreja de S. Roque, em Lisboa
Aguarela
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Aqueduto das Aguas Livres
Aguarela sobre papel
9 x 13,8 cm
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Torre de Belém
Aguarela sobre papel
39 x 47 cm
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Rua de S. Miguel, em Alfama
Aguarela sobre papel
65,5 x 41 cm
Feito para a obra
Lisboa Velha, estampa 89
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Lisboa Velha: Alfama
Aguarela sobre papel
26,5 x 18 cm
1918
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Terreiro do Paço
1898
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Coimbra
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Noite de luar
(Amadora)
Aguarela sobre papel
21 x 30 cm
Ver Exposição de 1920 (108)
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Rio de Janeiro
Aguarela
17 x 26 cm
1922
JPMB
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Ilhéu fantasiado contraposto a uma cidade “paleotécnica” fumarenta
JPMB
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