Vista de mar, rochedos e areia
Aguarela sobre papel
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A paisagem apresenta uma heterogénea estrutura de água, areia e rochedos, numa complexa definição de planos. O mar, no qual alternam tonalidades de azul e de verde, e que se torna translúcido quando as ondas se elevam, desfaz-se em espuma que embate na areia. Com o impacto, as águas deslizam ao longo da enorme duna em declive, até à lagoa, onde retomam os mesmos cambiantes do mar; no entanto, adquiriram agora uma tonalidade mais sombria. À esquerda, o amontoado das rochas eleva-se sobre uma plataforma sobranceira ao monte de areia, de impressionante dimensão. As diminutas proporções da camponesa e do burro estabelecem um flagrante contraste com as proporções do areal e marcam, implicitamente, o seu distanciamento em relação ao primeiro plano, efeito também conseguido pela oposição cromática entre o tom claro da areia e a gama mais escura dos rochedos. Por outro lado, as figuras da mulher e do animal introduzem uma nota de vida nesta natureza estranha.
Esta vista panorâmica apresenta uma acentuada disparidade de formas e de constituição morfológica; porém, o pintor encontrou na harmonia cromática uma forma de compensação e de equilíbrio. As cores distribuem-se numa gradação de ocres claros e de castanhos, que percorrem uma escala que vai de um tom mais escuro até uma cor de terra avermelhada, assim como de verdes e de azuis. O artista procedeu, assim, à mistura de tons quentes e frios que não se chocam, mas se harmonizam esteticamente. A estreita faixa de céu, de um azul quase uniforme, permite dar um maior realce aos outros elementos constitutivos da composição. Temos a percepção de que o sol inunda a paisagem de claridade e define os valores de luz e de sombra, acentuando as formas irregulares dos penhascos.
Maria Lucília Abreu
in A Aguarela na Arte Portuguesa, ACD Editores, 2008