Batalha dos Atoleiros (1966)

Frescos no Palácio da Justiça de Fronteira
(Palácio de Justiça inaugurado a 16-04-1967)
(Dimensões: 3,25 m x 6,70 m)

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“Procurámos exprimir nesta pintura o primeiro embate entre a Cavalaria castelhana e a Infantaria portuguesa, constituída pela peonagem e por cavaleiros apeados. Foi esta a primeira batalha "pé terra" posta em Portugal pelo Condestável, que introduziu esta nova táctica na Península.

O contraste entre a modéstia das forças resistentes ao invasor e o poder das forças deste acentua-se nas linhas mestras da composição, opondo-se uma expressão horizontal e de tons pobres, nos defensores, e uma volumosa confusão do rico e surpreendido atacante. Sobre este, uma nuvem escura acompanha-o, como uma ameaça que invade a serenidade dos campos.

A indumentária e a armaria do final do séc. XIV não são das melhores documentadas. Todavia há muito bons elementos, recentemente postos em relevo, bem característicos dessa época. Esses foram aqui empregados, saindo-se, por vezes do que é mais corrente.

Assim, a bandeira de Nun'Alvares segue a interpretação dada por alguns dos nossos melhores heraldistas à descrição que dela faz Fernão Lopes, e que se afasta da vulgar, principalmente em considerar-se a cruz como sendo a de S. Jorge e não a cruz folrdelisada vermelha dos Pereiras e com escudetes aos cantos em vez de quadrados. Com isto tira-se à bandeira o seu carácter quatrocentista, reintegrando-se na sua natural feição trecentista.

Para a indumentária do Condestável decidimos não respeitar a xilogravura da crónica, em que se baseiam todas as evocações condestrabinas que conhecemos, e onde ele se representa de cota de armas (veste de pano solto, com a cruz dos Pereiras) e de armadura branca, coisas características dos meados do séc XV, época em que a gravura foi feita. Não se compreende esta insistência, quando temos as palavras claras de Fernão Lopes, a propósito de Aljubarrota, depois dos Atoleiros:

"Ali não havia cotas de armas porque o conde nem outros fidalgos fossem conhecidos, que ainda então não era em uso, mas o conde trazia uma jaqueta de lã verde toda bordada de roseiras, daí cota (de malha, entenda-se) e peito e braçais e arnêz de pernas e guantes, segundo de cote costumava e sempre espada cinta e adágua, salvo quando ouvia missa"...

Não nos lembramos de ver qualquer notícia do Condestável usar cota de armas. O próprio Rei, em Aljubarrota, veste um loudel "semeado de rodas de ramos e em meio outras rodas e escudos de S. Jorge". Ainda não usava a cota de armas real que se vê no seu jacente da Batalha.

A jaqueta era uma veste muito justa ao corpo e chegando bastante abaixo das ancas, acolchoada, especialmente no peito, e cobrindo a armadura, que era ainda a cota de malha e aparecia apenas uma faixa abaixo da jaqueta. Sobre a malha mas sob a jaqueta, algumas folhas de ferro protegiam o peito, numa saliência muito pronunciada, para facilitar o escorregamento das terríveis e finas setas dos arqueiros, então em plena forma, e à quais a simples malha não resistia. A "armadura branca", toda de chapas e sabiamente articulada para consentir todos os movimentos, levaria ainda algumas décadas a aparecer, completa e perfeita, como nos é sugerida pela gravura da "crónica do Condestabre".

Não nos parece razoável representar-se Nun'Alvares das batalhas com "armadura branca" e flutuante cota de armas, tanto mais que a "cintura de vespa" da jaqueta justa e de alto prito, e de rico e ornamentado cinto nas ancas, favorece muito o aspecto moço do delgado rapaz de 23 anos que era então o Condestável. Teremos também de o representar com bacinete de camal, em cara; temos pena de não podermos figurá-lo de cabeça nua, com o belo penteado que a nobreza usava, anelado e simples, bem diferente da cabeleira de anjo manuelino que, com o desprezo de uma evolução de mais de um século, tão falsamente lhe tem sido imposta nas suas evocações contemporâneas.

Seja-nos revelado o estendal de bem fácil erudição que aqui pomos, mas na verdade perece-me não deverem perder-se elementos como estes adjuvantes do sentimento de madrugada que se desprende desta época, quando a Nação acordava para grandes destinos. Conhecimentos desta natureza, quando utilizados com bom critério, supomos não intervirem na "coisa artística" senão beneficamente, por ajudarem a "viver" os tempos evocados. Mouzinho não poderia ser representado com farda de paraquedista.

Da cavalaria espanhola teremos a destacar o pendão do Mestre de Alcântara e talvez o do Conde de Niebla. Outros pendões variados o acompanharão. Julgo de crer-se que também em Castela, como em Portugal (é ainda Fernão Lopes que no-lo diz) "as bandeiras e os balsões era como a cada um prazia de ter, que aí não havia então Rei de Armas nem outro arauto que a ninguém desdissesse".

A rica, ordenada heráldica, sob a autoridade de um Rei de Armas ou de um heraldo que a regulasse, viria para Portugal com os ingleses que acompanharam D. Filipa”

Fevereiro 1965, Jaime Martins Barata

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“É fora de dúvida o melhor dos frescos executados não só como qualidade de pintura, como de composição e cor.

Talvez o único trabalho que satisfez em parte o artista, que era sempre insatisfeito.

Representa o embate das hostes de Nuno Álvares Pereira com as suas poucas gentes, a pé, na sua maioria gente do povo, com armas diversas e pobres, com a avalanche de cavaleiros espanhóis, nobres ricos, bem montados e ataviados, e até (como diz a Crónica) “perfumados com água de rosas”.

Destaca-se a figura de Nuno Álvares com a lança em riste, de pequena estatura e de perfil ligeiramente bicudo, também como é descrito nas crónicas.

A pintura mede 7m de comprimento por 3,30. “Onde um forte capitão fez forte a fraca gente”. “A bandeira de Nuno Álvares segue a interpretação dada por alguns dos nossos melhores heraldistas à descrição que dela faz Fernão Lopes, e que se afasta da vulgar, principalmente em considerar-se a cruz como sendo a de S. Jorge e não a cruz flordelizada vermelha dos Pereiras e com escudetes aos cantos em vez de quadrados. Com isto, tira-se à bandeira o seu carácter quatrocentista, reintegrando-se na sua natural feição trecentista.

Para a indumentária do Condestável decidimos não respeitar a xilogravura da crónica, em que se baseiam todas as evocações condestabrinas que conhecemos, e onde ele se representa de cota de armas (veste de pano solto, com a cruz dos Pereiras) e de “armadura branca”, coisas características dos meados do século XV, época em que a gravura foi feita. Não se compreende esta insistência, quando temos as palavras claras de Fernão Lopes, a propósito de Aljubarrota, depois dos Atoleiros: “Alli não havia cotas de armas porque o Conde nem outros fidalgos fossem conhecidos, ca ainda entonce não era em uso, mas o Conde trazia uma jaqueta de lã verde toda bordada de roseiras, des-ahi cota (de malha, entenda-se), peito e braços”, etc. Crónicas.”

Màmía Roque Gameiro Martins Barata


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Outra descrição

“Combate travado em 6.4.1384 no local pantanoso dos Atoleiros, entre Sousel e Fronteira. Foi a primeira aplicação, em Portugal, da nova táctica, introduzida na Europa durante a Guerra dos Cem Anos, que evidenciou o valor da defensiva para parar o avanço do inimigo, desgastá-lo e conseguir equilíbrio de forças favorável à passagem à ofensiva; e, bem assim, a supremacia da infantaria no campo de batalha. Invadido o País pelo rei castelhano e nomeado Nuno Álvares Pereira, com poderes especiais, fronteiro do Alentejo, onde diversos lugares estavam por Castela, reuniu cerca de 300 lanças, ou 1500 homens, dos quais 100 besteiros, marchando de Estremoz ao encontro do invasor, do efectivo de 1000 lanças. Nuno, em inferioridade numérica, decidiu esperar o inimigo, em posição favorável à defensiva, tirando vantagem da adaptação das armas ao terreno, e adoptou um dispositivo rectangular, escalonado, e constituído por vanguarda, próprio para enfrentar uma acção de envolvimento da numerosa cavalaria adversa, com todos os seus efectivos apeados, em que as sucessivas filas das compridas lanças eram cravadas no chão, inclinadas para a frente e aguentadas pela firmeza do braço dos combatentes, formando uma sebe eriçada de pontas. Os besteiros foram distribuídos adequadamente para crivarem o inimigo com os seus tiros. Menosprezando os castelhanos a pequena hoste portuguesa, confiados na potência do choque, vieram cravar-se nas lanças, caindo de roldão cavalos e cavaleiros, enquanto os besteiros e fileiras da retaguarda alvejavam com nuvens de virotões e dardos as vagas sucessivas, que se embaraçavam nos seus próprios combatentes caídos, tombando por sua vez. Pouco durou a refrega, terminando pela fuga dos castelhanos, que sofreram perdas qualitativamente graves, que influíram no seu desânimo. Dos portugueses não houve mortos nem feridos. Nuno ainda ordenou a perseguição durante uma légua. A B. A. muito contribuiu para a vitória da causa da independência.”

(Baptista Barreiros, E.L.B.C.)


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Ver Crónica do Condestável de Portugal, por um autor anónimo do século XV, adaptação de Jaime Cortesão, Capítulo VII: DE COMO NUN’ÁLVARES PÔS EM PORTUGAL A PRIMEIRA BATALHA PÉ TERRA E A VENCEU

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