Retrato de Júlio Dinis
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O retrato do escritor não partiu de um registo do natural, como era usual no processo de criação artística de Roque Gameiro, devido a condicionamentos de ordem cronológica: ele nasceu em 1864 e Júlio Dinis, aliás, Joaquim Guilherme Gomes Coelho morreu em 1871. O pintor deve ter, pois, desenhado a imagem, com base em documentos iconográficos existentes.
Apesar disso, encontramos, neste trabalho, o cunho pessoal do artista na feição de reproduzir a figura humana. No delinear dos traços fisionómicos, traduzindo a acuidade do olhar, no modelado das mãos animadas de vida própria como se explicitassem emoções contidas, e finalmente, no tratamento dado aos valores cromático reconhecemos a expressividade inerente aos muitos retratos que ele executou ao longo da sua vida.
A fim de proceder à valoração de volumes que definem e individualizam as peças de vestuário, Roque Gameiro estabelece um ajustamento de luz e de sombra, neste claro-escuro monocromático em que só intervém o negro da grafite. E nas zonas em que cria contrastes fortes da luminosidade do branco absoluto, ainda distingue a mancha mais clara da camisa em relação ao colete, acentuado por ligeiro sombreado. Utilizando o mesmo processo, dá relevo à ondulação do cabelo, marca a incidência de luz, deixando que o branco do papel surja, a espaços.
Maria Lucília Abreu
in Roque Gameiro - O Homen e a Obra, ACD Editores, 2005